Digo-vos uma coisa... pior que a Loja do Cidadão, a secretaria da FCSH, o Apoio a Clientes da TMN às seis da tarde, o trânsito de manhã a partir do nó do estádio, tudo somadinho, é o Centro de Saúde.
No primeiro dia, entrei e tirei uma senha daquele presunto que está à entrada (o objecto encarnado que fabrica senhas de vez, espero que dê para visualizar), ao lado do segurança. Ainda faltavam oitenta senhas para chegar à minha. Não faz mal, há lugar sentado e uma pilha de TV 7 dias. Vim a descobrir mais tarde que não precisava de ter tirado a senha do presunto (amarela), porque havia senhas verdes guardadas na gaveta para as pessoas que só queriam uma receita (que era o meu caso) e para as quais o tempo de espera era de aproximadamente 15 minutos. Mas para aceder a essa senha seria preciso especificar a situação ao segurança, preencher um papelinho, assinar e cortar pelo picotado. Depois, aí sim, ele abriria a gaveta com a chave e tiraria a senha dos 15 minutos. Ora, ninguém sabe disto, por isso é que a única senha que está no presunto, a amarela, tem um tempo de espera de uma hora.
Ninguém gosta de esperar, portanto devem imaginar que o ambiente é um bocado tenso. Ainda por cima está calor, as paredes são amarelo-pálido, as senhoras da recepção não são especialmente prestáveis, há pessoas doentes... mas sobretudo, ninguém gosta de esperar sem razão.
Eram então duas horas, quando um senhor, farto de ouvir a recepcionista ao telefone com o filho "Tens que te preparar para o exame de português!", decidiu desligar a PlayStation Portable, levantar-se e perguntar a que se devia a espera de quatro horas a que tinha sido sujeito. Tinha marcado consulta para um médico e nunca mais era chamado. Quatro horas... isto é um sinal de que a PlayStation num lugar como este aparvalha as pessoas. Então o senhor espera quatro horas pelo médico e só vai perguntar o que se passa quatro horas depois? Não sei, parece-me que há por aqui algures um problema social também...
Anyway, o senhor obteve a seguinte resposta: "Ah, mas o médico hoje não vem, eu há bocado fui à sala de espera dizer". Bem... obviamente que não tinha ido dizer coisíssima nenhuma, porque se amotinou logo ali uma ou duas dezenas de pessoas que não tinha conhecimento do facto (e que também tinha esperado quatro horas... e sem PlayStation, o que é ainda mais grave). O que se passou a seguir foi bastante surreal. Por entre gritos e pessoas que saltavam como num desenho animado, ouvia-se a voz do senhor da PlayStation: "Você é uma mentirossa!!", "Vocês são todas é uma cambada de mentirossas!", "Uma carga de porrada era o que você merecia!", "Mentirossa!". E enquanto dizia isto, movimentava-se nervosamente de um lado para o outro e levantava a mão para aplicar a tal carga de porrada, formando um círculo vazio à volta dele, onde se sentia, sobretudo, medo. Veio então a PSP, que encheu o centro de saúde de uma cor azul, mas que não pôde fazer mais nada, porque, afinal de contas, "O senhor tem razão! Coitado, tanto tempo à espera! Não se faz...". Claro, uma carga de porrada é que era! Livro de Reclamações, queixinhas ao Ministério da Saúde, isso é para meninos! Uma carga de porrada sim! Claro que eu não diria para prender ou tratar mal o senhor (estar num Centro de Saúde já é em si uma condenação muito dolorosa), mas umas palavrinhas para o acalmar não teria sido má ideia...
E querem saber o que aconteceu no final? Os doentes foram distribuídos por outros médicos que lá estavam e numa hora estavam prontos para ir à sua vidinha. As senhoras da recepção encheram-se de boa vontade e profissionalismo (woooow), louvadas sejam! Agora expliquem-me, se souberem (o que não acredito) porque é que esta decisão não foi tomada antes do motim.