Às vezes, no pasa nada. Passa-se o despertador de manhã, o cafezinho antes de fazer qualquer movimento brusco, a corrida para um tipo indeterminado de transporte público, o mp3 sem pilha, blá blá blá. Mas depois há outros que entram e entram e entram cheios de novidades, de tal maneira que começam a querer sair. Resultado: palavras que explodem pela boca, metidas pelo meio de frases rápidas e, a custo, com sentido. BLÁ BLÁ BLÁ e vai cuspindo os óculos da senhora desconhecida a quem está chatear com a necessidade fisiológica de contar o acontecimento estrondoso que presenciou e faz gestos e griiita imenso e assusta as pessoas que estão à volta!!! O bom dos blogs é que se pode contar histórias educadamente.
Também não é razão para tanto, mas estas coisas deixam-me entusiasmada, o que é que querem, fazem-me sentir ligada ao povão! (sem qualquer sentido depreciativo, gosto muito da palavra, é cómica e tem força).
Então, aconteceu que há uma semana, estava eu a ler o único jornal no café do Senhor Armindo (olha ela a justificar-se...), que me diverte sempre (quando não estou virada para a depressão - é muito deprimente o jornal, há muitos acidentes de carro e muitas famílias que se matam), a saber, como já devem estar à espera, o Correio da Manhã, quando entram dois senhores gordos (mas mesmo gordos, obesos, gigantes para os lados, a ocupar um espaço imenso). O gato do Senhor Armindo, o Nico, levou logo um pontapé de uma senhora que estava sentada à mesa. E conforme levou o pontapé, caiu da cadeira e fugiu. Pois é, os senhores gordos eram os inspectores da ASAE.
Ehhh lá!! Queres ver que vou assistir in loco ao acontecimento que vai abrir todos os telejornais? Será que farei a minha fantástica aparição na TV a dizer qualquer coisa como: "Este país... isto esta gente anda toda é na caça à multa! Ladrões!" E assisti mesmo. Não abriu o telejornal, mas não faz mal.
O modo como se comportam os inspectores da ASAE dá verdadeiramente que pensar. Nem é por serem arrogantes, ou por serem implicantes, não é nada disso. É por parecerem astronautas quando entram na cozinha. Quando começam a sacar da touca, da bata branca, das luvas, da seringa, do estetoscópio, do bisturi (pronto, já chega, foi um delírio), mas quando começam a munir-se de uma data de utensílios protectores da infecção, eu juro que engulo em seco e penso: oh meu Deus... o que nós comemos. ELES VÃO ENFRENTAR O VÍRUS!
Para aquela gente não poder ter um milímetro de pele encostada ao balcão onde o Senhor Armindo descasca as batatas, é porque a coisa está má... é que nós, consumidores, não só encostamos um milímetro de pele, como comemos (com prazer, diga-se). Seres esfomeados ingénuos... alguns totós até se fotografam a comer!
Mas calma, vamos lá pensar um bocadinho! É que não pode ser! Eu recuso-me a ceder a esta visão panicada (vem de pânico e foi inventada) dos restaurantes. É porque os chineses cozinham gatinhos, é porque no McDonald's cospem nos hamburgers das pessoas antipáticas, é porque na arrecadação do restaurantezinho português há ratos, é porque o Senhor Não-sei-quantos não lava a cozinha! Chega de criar restaurantes-laboratório! O Senhor Armindo lá fechou porque tinha a arrecadação a cair aos bocados. E acho muito bem que vá arranjá-la, pronto! Mas tanta fita! Tanto "deixe lá ir ver a cozinha............. e agora talvez a casa de banho......... diga-me lá, acha que é preciso ir à arrecadação ou tem-se portado bem? E, já agora, a máquina de lavar loiça, não vá ter posto também o papagaio a tomar banho para aproveitar as águas". "Preencha lá o papel aqui e ali, assine dez vezes e ponha um aviso na porta a dizer que vai fechar. Por tempo indeterminado". Oh, não é bonito isto. Um bocadinho menos de profissionalismo medicoastronauta e mais de profissionalismo social também não lhes fazia mal nenhum. Coitado do Senhor Armindo.